Lei do Motorista: Insegurança jurídica desafia aplicação, dizem especialistas

Especialistas debateram impactos da legislação nas transportadoras e motoristas e pediram revisão técnica e diálogo entre as partes envolvidas

Durante webinar promovido pelo ATS Jornada by nstech, especialistas em transporte e direito trabalhista discutiram os impactos da Lei do Motorista (Lei 13.103/2015) e os efeitos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5322, julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A legislação, que visa regular a jornada dos motoristas profissionais, continua sendo alvo de incertezas mesmo após mais de uma década de existência.

Participaram do debate o advogado especialista em transporte e logística Narciso Figueirôa Jr. e o diretor jurídico da TransJordano, Ricardo Soares, com mediação do gestor do ATS Jornada, Ednei Rebonatto. “No Brasil, até o passado é incerto. É inacreditável que, 13 anos depois da primeira versão da lei, ainda estejamos falando em regulamentação”, destacou o mediador.

A ausência de normas claras do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) sobre o controle eletrônico de jornada ainda preocupa o setor. A decisão do STF que julgou inconstitucionais quatro dispositivos da lei agravou esse cenário. Entre os pontos derrubados estão a possibilidade de fracionamento do descanso interjornada e a acumulação do descanso semanal remunerado (DSR).

Para Narciso Figueirôa Jr., a modulação dos efeitos da decisão — que evitou a retroatividade da inconstitucionalidade — foi essencial. “Seria antijurídico obrigar empresas a considerarem como inválido algo que estava de acordo com a lei vigente à época”, afirmou.

A íntegra do bate-papo está disponível no canal da nstech.

DEBATE JURÍDICO E IMPACTOS OPERACIONAIS

Mesmo com as tentativas de adaptação, as transportadoras enfrentam alto índice de judicialização. “Mesmo que o controle de jornada esteja correto, recebemos ações infundadas. Se a empresa não consegue comprovar a fidedignidade, os prejuízos podem ultrapassar um milhão de reais”, afirmou Ricardo Soares, ao relatar a realidade enfrentada pelas empresas do setor.

Embora o STF tenha considerado constitucionais pontos como o exame toxicológico e a jornada flexível, persistem dúvidas sobre o alcance da negociação coletiva. “Nem a própria lei oferece segurança jurídica. Como garantir que um acordo coletivo vai proteger a empresa?”, questionou Soares.

Para Figueirôa, a negociação é possível, desde que feita com cautela, em caráter excepcional e com envolvimento direto dos motoristas. “Ela deve respeitar direitos indisponíveis e ser respaldada por uma manifestação clara dos trabalhadores”, pontuou.

A obrigatoriedade das 11 horas ininterruptas de descanso também gerou críticas. “O STF disse que o tempo de espera afasta o motorista da família, mas obrigá-lo a ficar parado em um posto por 11 horas faz exatamente isso”, disse Figueirôa.

Rebonatto reforçou que o tempo ocioso tem levado ao aumento de consumo de álcool e drogas em paradas de estrada. Além disso, bons motoristas têm migrado para empresas informais, onde conseguem “rodar mais”, ainda que sem a proteção legal adequada.

TECNOLOGIA E CAMINHOS PARA O FUTURO

Apesar das dificuldades, a tecnologia tem sido uma aliada para garantir segurança jurídica e prevenir acidentes. Sistemas de controle de jornada, câmeras embarcadas e inteligência artificial já permitem o monitoramento de fadiga e cumprimento de pausas obrigatórias. “Tivemos um caso em que o sistema acusou fadiga. O motorista foi examinado e descobriu um tumor cerebral. Salvamos uma vida”, relatou Soares.

Ainda assim, o uso de tecnologia esbarra em uma legislação antiga. “Dá para fazer muito mais, mas estamos engessados por normas da década de 1940”, afirmou Rebonatto. Os especialistas defenderam uma revisão do Código de Trânsito e da própria Lei do Motorista com base em estudos técnicos e audiências públicas que envolvam transportadores, motoristas e entidades sindicais.

A situação dos autônomos também foi tema de debate. Embora não estejam sujeitos às mesmas regras da CLT, os especialistas recomendam que transportadoras colham declarações de que os descansos foram respeitados, como forma de proteção jurídica.

“A empresa não tem que controlar o tempo de direção do autônomo, mas deve garantir que ele declare que está em conformidade com o intervalo exigido”, explicou Figueirôa.

Ao final do encontro, o alerta foi unânime: as transportadoras precisam agir com cautela, sempre com respaldo jurídico. “Não dá para tomar decisões com base em vídeos de WhatsApp ou notas de internet. Tragam o jurídico para a mesa”, reforçou Rebonatto.

Para Soares, o fortalecimento da comunidade jurídica do setor e o apoio das entidades de classe são os caminhos para uma atuação mais segura e estratégica. “A união e o conhecimento técnico são fundamentais para enfrentar esse cenário instável.”

Fonte: Mundo Logística. Foto Shutterstock

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