Criação de agência reguladora em Minas Gerais é considerada uma evolução em termos de gestão pública por especialista
Por Juliana Sodré (Repórter)
Com o objetivo de regular e fiscalizar os contratos de infraestrutura rodoviária, aeroportuária, hidroviária e ferroviária operados por empresas privadas em Minas Gerais, o governador Romeu Zema (Novo) sancionou, na sexta-feira (9), a Lei nº 25.235/2025 que cria a Agência Reguladora de Transportes de Minas Gerais (Artemig). Para entender a eficácia e as vantagens desse novo órgão, o Diário do Comércio ouviu especialistas que foram unânimes em dizer que a autonomia da agência é fator primordial para garantir a sua eficácia.
Conforme defende o governador, a criação dessa entidade traz segurança jurídica aos entes privados do setor e confiança a respeito da fiscalização e regulação dos serviços, bem como dos padrões técnicos que serão observados, de forma a tornar o Estado mais atraente para os investimentos privados.
De fato, os especialistas enxergam a criação da agência de forma positiva. O professor do curso de ciências contábeis da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ricardo Martins, acredita que a criação da agência é uma grande evolução na gestão pública. “Inspiradas em outras agências, a criação da Artemig é uma mudança de chave do Estado provedor e operador da infraestrutura para o Estado fiscalizador”, explica.
Segundo Martins, a criação da agência implica em regras e fiscalização. “Ela cria também condições para o planejamento da infraestrutura, fato importante já que a fiscalização da execução dos contratos e da qualidade dos serviços impactam diretamente a vida dos contribuintes, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas”, comenta.
A médio e longo prazos, o professor acredita que caberá à agência a atribuição de planejar a infraestrutura, fazer diagnósticos e planejamentos de crescimento e do aumento da capacidade das vias, que são fundamentais para o desenvolvimento.
Na avaliação do professor, com o tempo, a agência será apta a avaliar a necessidade de novas vias e das novas modalidades de transporte, reduzindo os congestionamentos, os custos e colocando as cargas nas modalidades devidas. “Temos o exemplo do minério. São cargas volumosas que poderiam estar em outra modalidade que não o rodoviário. Isso onera as rodovias e congestiona nossas vias. Onera nosso bolso por causa dos custos dos seguros, da manutenção dos veículos. Então, a capacidade de planejamento é fundamental”, avalia.
No entanto, apesar de favorável à criação de agências independentes do Executivo, o coordenador da Comissão Técnica de Transporte da Sociedade Mineira de Engenharia (SME), Nelson Dantas, ressalta as experiências com as agências reguladoras nacionais. Segundo ele, elas mostram que, com o tempo, não foi esse o papel que as agências tomaram para si. “Houve um deslocamento da engenharia nos processos de planejamento, caracterizando uma experiência ruim. As agências começam a regular os contratos sem planejar ou executar políticas de transportes. Elas não planejam e continuam apenas na gestão de contratos”, aponta.
Para o coordenador da Comissão Técnica de Transporte da SME, o “esvaziamento” do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de Minas Gerais (DER-MG) é uma medida que anula o histórico de uma instituição de cerca de 80 anos. “O braço do Executivo que cuidava dos contratos era o DER-MG e ele foi esvaziado. Daí, cria-se uma agência do ‘zero’ para fazer praticamente a mesma coisa, enquanto deveriam ter fortalecido as áreas de planejamento e execução. É um desperdício. Deveriam ter fortalecido o DER-MG, as áreas de planejamento primeiro e a parte que cuidaria da regulação, saísse para esse novo órgão”, opina.
Dantas considera que o DER era a instituição do transporte de Minas Gerais que acumulava uma história e uma experiência que era do Estado e não do governo. “Antes da criação da agência deveria ter tido um debate com a sociedade para avaliar vantagens e desvantagens e avaliar até onde ela deveria ir ou não ir”, avalia.
Pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG, Victor Medeiros ressalta a importância de ter uma autarquia com atuação independente para prevenir e evitar abusos por parte das concessionárias, sobretudo com o volume de contratos que têm sido feitos no Estado. Segundo ele, é importante assegurar que os serviços prestados terão a qualidade e a celeridade previstas em contratos.
No entanto, faz uma ressalva: o Executivo não pode ter qualquer parcela de poder de decisão dentro da agência. “Isso para qualquer agência reguladora, e não só a Artemig. Ela só terá eficácia garantida, caso tenha autonomia real frente ao Executivo”.
O economista professor da Estácio BH, Alisson Batista, também enxerga a criação da agência de forma positiva, uma vez que traz mais transparência às operações, negociações mais fluidas, concorrências mais justas e mais controle de indicadores. No entanto, faz ponderações, ressaltando a autonomia da instituição.
“Como toda a estrutura pública, há riscos da interferência política, de lobistas e da questão de indicação de cargos para a gestão da instituição. Um viés político pode prejudicar o pleno funcionamento”, pontua.
Portfólio da Seinfra é extenso
Atualmente, o portfólio de projetos estruturado pela Seinfra abrange diversas áreas de infraestrutura e é um dos mais robustos do País. A partir da criação da Artemig, a gestão desse tipo de contrato passará a ser de responsabilidade da agência.
A pasta possui sob sua gestão cinco contratos de concessões rodoviárias (MG-050, BR-135, Lote Triângulo Mineiro, Lote Sul de Minas e Lote Varginha-Furnas), que somam cerca de 2,2 quilômetros concedidos.
Há ainda o contrato de concessão do Rodoanel da RMBH em fase pré-operacional, que terá aproximadamente 70 quilômetros de extensão. E cinco projetos de concessões rodoviárias que estão em estruturação pelas equipes técnicas da secretaria: Lote Via Liberdade – Ouro Preto e Mariana e Lote Vetor Norte, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, com editais já publicados; Lote Noroeste; Lote Zona da Mata e Lote Quadrilátero Ferrífero, com estudos em fase de elaboração no momento.
A secretaria ainda é responsável pela gestão dos contratos de concessão do aeroporto da Pampulha, do Aeroporto Regional da Zona da Mata, balsas e do Metrô da Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Próximos passos: governo precisa apresentar decreto definindo cargos da Artemig em junho
A Artemig foi criada sob a responsabilidade da Secretaria de Estado de Infraestrutura, Mobilidade e Parcerias (Seinfra), que agora, deve seguir os prazos legais para estruturar e colocar a nova autarquia em funcionamento.
De acordo com informações da própria secretaria, os próximos passos incluem a publicação do decreto que definirá os cargos da agência, prevista para ocorrer em até 30 dias após a publicação da lei.
Em seguida, está prevista a nomeação da primeira diretoria colegiada da Artemig, que dará início às fases subsequentes, como a comunicação oficial às empresas reguladas, a organização dos contratos sob a responsabilidade da agência e a elaboração do regimento interno, cuja publicação está prevista para até 180 dias após a nomeação da diretoria.
A Artemig será financiada por recursos do orçamento estadual, além de taxas de fiscalização, convênios, contratos e outras receitas.
Ainda conforme informações da Seinfra, a implantação da Artemig será feita sem custos adicionais para o Estado, por meio do remanejamento de recursos já existentes na própria secretaria. A estrutura inicial da agência será montada com pessoal e recursos já disponíveis, sem a necessidade de criação de novos cargos ou aumento de despesas.
Fonte: Diário do Comércio